quarta-feira, 19 de maio de 2010

O campeonato em análise: Um ano em retrospectiva

O FC Porto fechou a época 2009/2010 como arrancou. A vencer. Mas foi um longo oásis num ano vestido de vermelho. O Benfica igualou os dragões em títulos, levando para casa o troféu mais apetecido, cinco anos depois da última vitória. E o Sp.Braga, sem troféus que reclamar, consagrou-se como a equipa do ano levando o seu sonho até aos derradeiros instantes da prova. Para a próxima temporada avinha-se um duelo mais equilibrado. Espera-se um Sporting renascido, sob a batuta de Paulo Sérgio, e um Sp.Braga que se torna, a partir de agora, numa verdadeira incógnita. Lado a lado estarão, certamente, águias e dragões, numa luta que promete durar, desta vez, até ao fim.

O Benfica coroou-se campeão nacional depois de um ano de altos e baixos.
A equipa orientada por Jorge Jesus arrancou de forma espectacular na prova, com sucessivas goleadas, mas foi perdendo gás. Trocou o futebol espectáculo por um modelo mais cínico e eficaz e a aposta saiu bem. Aguentou a pressão de FC Porto e Sp.Braga e tropeçou menos que os rivais. Montou um esquema táctico equilibrado, com laterais rápidos, um bloco de meio-campo sólido e um ataque que apostava nas trocas de posição. Cardozo ficou a ganhar e levou para casa a bota de goleador, mas o mérito deveria ser repartido pelos seus principais assistentes, Saviola e Di María. O clube encarnado soube passar ao lado das suspensões polémicas que marcaram a prova mas mesmo assim teve de esperar ao último momento para erguer a taça. Que, por certo, se entregou pela primeira vez no último dia da prova. Na Liga ninguém duvidava do desenlace final.

Do outro lado do Atlântico esteve, nessa tarde, o Sp.Braga, de sonho desfeito.
A equipa de Domingos Paciência foi um exemplo de estoicidade durante toda a época, com prémio europeu incluído. Melhor classificação de sempre, mesmo sem Vandinho (e Mossoró) durante largos jogos, o Sp.Braga começou bem a época e foi o primeiro a derrotar o Benfica. Aplicou a mesma fórmula aos três grandes e emergiu como líder natural do torneio. Mesmo quando ultrapassado, aguentou a pedalada do camisola amarela e demonstrou que, com eficácia, se consegue tanto ou mais do que com espectáculo. Um 4x2x3x1 inteligente, que o técnico portuense soube interpretar bem do princípio ao fim. Numa equipa sem protagonistas, o Sp.Braga foi a sensação do ano.

A fechar o pódio, o FC Porto.

O tetracampeão nunca mostrou argumentos para revalidar o título. Apesar dos golos (e grandes exibições) de Falcao, a equipa orientada por Jesualdo Ferreira passou o ano perdida. Perdeu pontos fora de casa com rivais insuspeitos, perdeu tantos jogos como ganhou com os três rivais directos, e no final de contas, chegou ao final da época sem nenhuma ambição. Sem Hulk durante três meses, o FC Porto viveu o seu melhor período com o bom futebol de Varela, Falcao e o recém-chegado Rúben Micael. Mas rapidamente o balão perdeu ar, a equipa voltou a tropeçar, de forma definitiva, e disse adeus ao segundo penta da sua história. Um ano de muitas lições, desportivas e não só, que deixa antever uma mudança de ciclo no Dragão.


E se de Sporting e Vitória de Guimarães nem vale a pena falar, tais foram os tiros nos pés que foram dando, e que significaram falhar os principais objectivos da época, já méritos terão de ser atribuídos aos clubes madeirenses. Maritimo, pelo regresso à Europa, e Nacional, por aguentar largos meses sem o seu técnico, não deixando, no entanto, de apostar num futebol ofensivo e fluído, já marca da casa.


No lado oposto da classificação ficou claro que Portugal continua a ter um campeonato muito pouco competitivo, ao nível da mediania do leste e norte da Europa e longe da elite. O futebol praticado, a atitude em campo (e fora dele) e a ausência de uma política desportiva coerente e estável foi uma nota dominante em quase todos os clubes da segunda metade da tabela. No final, as descidas de Belenenses e Leixões confirmaram o que se esperava. Os do Restelo viram cumprida uma ameaça de há várias épocas; os de Matosinhos pagam pela péssima gestão desportiva, apenas ano e meio depois de terem estado entre os líderes da prova.

Análise de Miguel Lourenço Pereira, jornalista e autor do blogue Em Jogo