domingo, 28 de novembro de 2010

Sporting-FC Porto, 1-1 (crónica): Um clássico amargo

A TEIA DO LEÃO

Ponto prévio: o clássico foi mal jogado. Chegou a ter bons momentos, sim, teve sobretudo um leão forte e aguerrido no início, mas faltou intensidade, dinamismo e velocidade. O FC Porto foi surpreendido pela entrada forte, fortíssima, do Sporting, ficou à mercê, desconcentrado e inseguro, viu-se em desvantagem. Conseguiu equilibrar, tomar conta do jogo, empatar no reatamento. Estava por cima quando Maicon foi expulso. O jogo, nesse minuto sessenta e sete, terminou. Ganhou conflitos, escaramuças e quezílias. Desiludiu porque Hulk se eclipsou, porque Moutinho não encantou no regresso, porque o Sporting apenas durou até ao intervalo e porque Jorge Sousa esteve mal.

O FC Porto é um jogador de cartas que está na segunda parte do seu jogo. Perdeu a primeira. Apesar de contar com mais vitórias, de viver numa forma melhor e de ter maiores probabilidades de vencer, viu o adversário ser mais aguerrido, colocar mais agressividade em prática, ter outra agilidade nos seus movimentos e, com as suas cartas, jogar melhor. O jogador sportinguista encostou o portista às cordas e mostrou-o, talvez mais do que nunca nesta época, permissivo e inseguro. O portista tem bom jogo, sim, mas está lento, preso, desconcentrado. Consegue, puxando pelo orgulho e pela sua capacidade, reequilibrar, ganha pontos, aproxima-se da marca do rival, impõe a sua maior valia e, aos poucos, vira o jogo a seu favor. Explora o adversário e domina. Está empatado. E por cima. Até permitir que o rival, matreiro, lhe veja os trunfos.

O Sporting joga em casa, é grande, precisa de ganhar, está atrasado na luta, mas pode sempre, desde que não seja demasiado tarde para isso, despertar e revitalizar-se. Paulo Sérgio agarrou-se a isso. Deixou os treze pontos de lado, não entrou em pânico por causa de Hulk ou Falcao, sublinhou e marcou a vermelho, carregado e em letras garrafais, que o Sporting, jogando concentrado e com consistência, poderia bater o pé ao FC Porto. Teria de trocar as voltas ao dragão, entrar forte, roubar a bola, intimidar, chegar perto da baliza de Helton e impedir as saídas azuis. Jogando num sistema diferente, com três médios e três atacantes, o Sporting lançou boas cartas no início, foi inteligente na forma como impediu os ases portistas de saltarem do baralho e uniu-se em torno desse objectivo. Construiu, circulou e rematou. Para assustar e marcar.

SIM, ESTE LEÃO TEM FORÇA!

Já Liedson atirara ao lado, já Postiga o imitara, já Pedro Mendes acertara em cheio na trave. O FC Porto, pelo meio, conseguira uma oportunidade de ouro, caída do céu nos pés de Radamel Falcao, que terminou esbanjada pelo avançado colombiano. O jogo fora, desde o início, interessante, aberto, entretido. O Sporting estivera sempre por cima: mais pressionante, mais dinâmico, mais solto e mais capaz. Chegou ao golo, depois das ameaças, num lance simples, com irregularidade que passou em claro, por Jaime Valdés. O chileno ganhou a Maicon, encarou Helton e rematou certeiro - foi irregular, sim, mas o brasileiro abusou da altivez. Caiu bem ao Sporting. A equipa leonina fizera por merecer, estivera melhor, criara mais perigo e dominara a toda a largura. O líder, tirando o lance de Falcao, esteve ausente. Teve displicência e pagou por isso.

André Villas Boas gritou, gesticulou e sentiu necessidade de mudar. Recolheu ao banco, pediu outra opinião e planeou mudanças. O FC Porto surgiu diferente no recomeço. Com o mesmo jogo na mão, mantendo todos os trunfos guardados, juntando uma atitude bem diferente, muito mais briosa, com pressão alta e jogo fluído. Os ases apareceram: Hulk e Falcao, sociedade mortífera, dupla de construção e finalização, em três momentos que levaram perigo a Rui Patrício, fizeram o Sporting recear e temer que a vantagem pudesse ser dizimada. O líder puxou dos galões. Equilibrou, reprimiu o leão, não repetiu a entrada e chegou ao empate: abertura de Moutinho, cruzamento de Hulk e emenda de Falcao. Saltou André Villas Boas. Conseguira marcar cedo. Só que Maicon, já ultrapassado no lance do golo, desleixou-se. E recebeu ordem de expulsão.

ESPREITAR AS CARTAS DO ADVERSÁRIO


O central brasileiro tem feito boa dupla com Rolando. Comete, contudo, erros evitáveis. Em Alvalade, por exemplo, mostrou por duas vezes as cartas ao adversário. Jaime Valdés e Liedson, astutos e oportunos, tiraram benefício, aproveitaram e deixaram o FC Porto em tremuras: primeiro com um golo e depois com uma expulsão - decisões erradas, ao que parece, por parte de Jorge Sousa, que já antes, embora se compreenda, não tenha visto uma agressão brutal de Maniche a João Moutinho. A expulsão de Maicon surgiu no melhor período azul, quando Hulk se destacara e o FC Porto tomara as rédeas do jogo. André Villas Boas foi obrigado a redefinir objectivos, alterou a equipa, reformatou a forma de jogar: tirou Falcao, lançou Otamendi, colmatou a cratera na defesa. Paulo Sérgio, em superioridade, lançou Yannick. O Sporting poderia aproveitar.

A verdade, no entanto, é que o jogo, a partir da expulsão de Maicon, perdeu-se. Subiu a agressividade, aumentaram as quezílias, as escaramuças, os tempos mortos e as alterações, tanto de um lado como do outro: o FC Porto para segurar o empate, apenas tendo Hulk sozinho contra o mundo na frente, ganhando consistência no meio-campo, e o Sporting, apostando todas as fichas, para chegar à vitória, infligir a primeira derrota ao líder e ganhar novo ânimo para poder caminhar com os olhos no topo. A saída precipitada de Maicon, deixando à mostra o jogo do FC Porto e impedindo que pudesse fazer uso dos seus trunfos nos momentos certos, levou consigo o futebol. Ambos se limitaram, depois, a jogar as cartas que sobraram, sempre numa postura ofensiva do Sporting e defensiva do FC Porto, até terminar o arsenal. O empate sabe melhor ao dragão.

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