domingo, 24 de outubro de 2010

Um Real Madrid à Mourinho

Mourinho gosta de problemas. Casos sérios, bicos-de-obra, um cabo de trabalhos para resolver. Não se contenta com pouco. Isso estaria à altura de um bom treinador. Mourinho quer ser mais. É corajoso, tem uma ambição sem limites, eleva o ego, abre o peito e aceita arriscar sem pestanejar. Dá tudo o que tem e quer ser imortal. Ultrapassar as barreiras, chegar mais alto do que nunca, deixar a sua marca, tornar-se um ídolo e transformar a realidade por onde passa. Foi campeão no FC Porto, devolveu a glória europeia, recuperou a força do dragão. Subiu para o Chelsea: campeão cinquenta anos depois, outro título no ano seguinte e estatuto reforçado para os blues. Já é muito, pouco para ele. Por isso foi campeão europeu num Internazionale há quarenta e cinco anos sem conquistas na Europa. Nunca está satisfeito. Poderia parar, relaxar, sair durante alguns anos, entrar numa espécie de sabática, para gozar do que ganhara. Mourinho não é assim.

Mourinho gosta de problemas. Ou problemas nem seja a palavra mais acertada. Também gosta, é verdade, mas neste caso aplica-se melhor grandes desafios. O maior, neste momento, é o Real Madrid: melhores jogadores mundiais juntos, constelação de estrelas, exigência maior do que nunca e época sem nada conquistado. Mourinho cumpriu a sua parte no Inter. Tinha Madrid à espera. Encaixam na perfeição. Tem que gerir emoções, sobrepor-se, ter pulso firme, combater a indisciplina e juntar o génio de todos, pegando aqui e ali, para formar uma equipa temível, capaz e pujante. O Real Madrid começou aos solavancos: empates, exibições sofríveis, assobios das bancadas, vitórias tiradas com esforço. Agora está bem, recomenda-se, vive feliz, ganha motivação. Marca, ganha e encanta. O público gosta, os jogadores sorriem, os críticos dão o braço a torcer, os adversários derrapam. Mourinho puxa pela ironia e alimenta o ego.

Pleno de vitórias na Liga dos Campeões, nove pontos, exibição de gala frente ao AC Milan e candidatura lançada. Na Liga espanhola, ao mesmo tempo, o Real Madrid aparece no primeiro lugar. Tem todas as condições para triunfar interna e externamente: jogadores, treinador e, agora, estabilidade. Necessita, para isso, de manter o ritmo, não diminuir a intensidade e querer sempre mais. Ser como Mourinho sempre foi. Impõe-se, mostra que tem o controlo da situação, junta as suas ideias e molda o pensamento de quem está sob o seu comando. O Real Madrid está a crescer como equipa. Com ela cresce, por exemplo, Cristiano Ronaldo. Tem liberdade, pode espalhar ao seu talento, ninguém lhe exige que resolva tudo ou que carregue a equipa. É o melhor marcador do campeonato espanhol. Nesta jornada, frente ao Racing, marcou quatro na goleada, por seis-um, aplicada pelos merengues. O Real está a despertar.

Diz-se que a construção é o que mais custa e, por isso, o pior. O Real Madrid está, ainda, nessa fase. Ainda é cedo para avaliar realmente a capacidade e a valia da equipa, sim, mas até agora, por tudo o que já ficou para trás, está a ser cumprida com qualidade e, até, brilhantismo. Está a solidificar-se como verdadeira equipa. E aí tem o dedo de Mourinho. O treinador português, por onde passa, tenha ou não jogadores de classe mundial, consegue construir verdadeiras equipas, fortíssimas a defender e matreiras no ataque, dando largas à criatividade. O Real Madrid é mais um exemplo. Tem condições, agora, para dar passos seguros, tranquilos, sempre em crescendo. Precisava de estabilidade, sobretudo emocional, não só na equipa, mas também na exigência dos adeptos. Mourinho consegue fazer-se ouvir, chega onde quer, alastra a mensagem a todos e faz aumentar a confiança numa temporada rica. Quer ganhar o maior desafio de sempre.

2 comentários:

Miguel Angelo disse...

Mais um grande texto...

tens muito jeito para este tipo de coisas.

cumprimentos

JornalSóDesporto disse...

Força Mourinho