quinta-feira, 26 de agosto de 2010

Opinião: O crescimento de um guerreiro burguês



Calma. Respirar, jogar, lutar e crescer. Correr por um sonho, por uma oportunidade que não se desperdiça com duas tretas, deixar tudo em campo, sentir o suor escorrer pelo rosto, antes de ser recompensado. Chamam-lhes guerreiros. Os Guerreiros do Minho, uma legião, vinda dos tempos antigos para se adaptar na modernidade: com raça, com querer, com enorme vontade de triunfar. Jogando pela certa, com riscos, sim, mas calculados, não pretendendo um passo maior do que a perna, uma ambição sem limites capaz de deitar tudo por terra, a aproximação aos grandes cada vez mais forte. O Sp.Braga não procura um título, um oásis num deserto, conquistado para enfeitar o currículo. Ganhou, faz-se a festa, esquece-se o futuro e emoldura-se esta vitória para a imortalidade: não. Isso seria um fogacho, um aparecimento repentino, nada efectivo. O que o Sp.Braga quer realmente é ser um grande. Com calma. Respira, joga, luta e cresce.

O Braguinha era um clube simpático. Capaz de se colocar nos primeiros lugares, capaz de disputar uma vaga europeia, capaz de alguns belos resultados. Ficava por aí. Sempre lhe faltou um clique para despertar e tentar afirmar-se, distanciando-se dos outros, dos tais pequenos onde estava inserido, para chegar ao topo. Já era burguês. Tinha historial, jogadores e resultados. Mas como qualquer burguês, situados ali numa posição intermédia, que nem é carne nem é peixe, interessa chegar à nobreza. Aos principais, aos que mandam, os que reúnem as atenções, que são o verdadeiro máximo da pirâmide. Aí, se bem com algumas intromissões de Boavista e Vitória de Guimarães, procurando a sua afirmação, estão os grandes. Dominam, conquistam, gerem. Entre si, ano após ano, discutem o título nacional e a representação europeia na Liga dos Campeões. Há excepções, sim, mas não passa disso: excepções a uma regra antiga.

Um burguês quer subir pelo seu mérito, pelas qualidades que possui, mantendo-se trabalhador para o resto da vida. Entra a lógica do capitalismo, do maior rendimento, para se fixar no cimo. Chegar ao topo, escalando a pirâmide a partir da base, é difícil. Mas bem pior do que isso, num jeito de missão impossível, é continuar, intrometer-se, juntar-se e, ao fim de um certo tempo, terminar com distinções: começou pobre, foi crescendo e amealhando resultados, chegou ao topo. Não por um ano, não por um momento, não por um espaço curto. Chegou e ponto. Está lá, faz parte do grupo, mostrou a sua fibra. O caso do Sp.Braga é assim. Não querendo sucesso imediato mas raro, sendo mais um a entrar em queda livre depois de subir mais alto do que nunca, cresce a cada dia, soma resultados que o engrandecem, exibições que o suportam, feitos alcançados que o colocam ao lado dos três grandes. Para passar a ser um deles.

O Sp.Braga foi vice-campeão, manteve grande parte do seu plantel, mesmo tendo perdido peças importantes, abriu horizontes para uma nova disputa até final no campeonato e garantiu um lugar na Liga dos Campeões. São feitos de grande. A adesão do público é cada vez maior, a cidade confunde-se com o clube e apoia-o, o Braguinha está enterrado de vez para dar lugar aos Guerreiros do Minho, representantes de uma região, lutadores incansáveis defendendo as cores portuguesas, colocando a fasquia cada vez mais elevada e exigindo cada vez mais a si próprios. Mesmo que ninguém o assuma. António Salvador, o principal obreiro do crescimento do Sp.Braga, não se coloca em bicos de pés, chamando a si as atenções, afirmando-se como quatro grande, como equipa que será campeã. Assume o desejo. É isso. No seu interior, por certo, saberá ser possível. Só que fica lá dentro apenas. Sob pena de ser mal-sucedido.

É mais um conceito burguês: o trabalho é a melhor forma de afirmação social. O Sp.Braga, para ser considerado um grande, não precisa de o anunciar aos sete ventos, gritar para todos os cantos do Mundo, encher o peito e dizer que nada deve aos grandes. Tem que o mostrar. Sem fazer ondas, sem se elevar, sem perder-se em confusões desnecessárias. O Sp.Braga quer ser grande, joga como um grande, luta pelos mesmos objectivos e equipara-se. Está ainda em crescimento, vai queimando etapas, sempre com a cabeça bem assente nos ombros e os pés pregados ao chão. Esse é o objectivo. Todos sabem que é, só poderia ser, o clube vive a sua melhor fase. Mas não é assumido declaradamente? E é preciso? Não, nada, porque a cobrança seria maior, a pressão também, o Sp.Braga teria de se tornar numa máquina. Assim, como quem não quer a coisa, como quem é outsider, ainda é capaz de surpreender.

Surpreender, como quem diz..., porque de surpresa tem pouco. É quase como uma telenovela, cheia de suspense e mistério, uma verdadeira caixinha de surpresas prometida, mas que afinal termina com um herói feliz da vida e um vilão, depois de muito se rir, arruinado. O Sp.Braga cresce, tem capacidade para subir ainda mais, largou o grupo em que estava para se aventurar numa corrida de perseguição os grandes. Está a ter sucesso, consegue lucrar, intromete-se na luta do título, faz com que seja olhado de outra forma para o futuro, além de ganhar dimensão europeia. Domingos Paciência tem mérito, soube manter e subir os níveis da equipa, superou a prova de fogo, conseguiu ser importante no crescimento do clube. Todos os treinadores foram, António Salvador sempre se apresentou como líder, empreendedor e competente, para que fosse possível. O Sp.Braga cresceu, ganhou um novo estatuto e continua em evolução. Sempre.

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