segunda-feira, 26 de julho de 2010

97º Tour de France: A análise - 1ª Parte

O TRI DE CONTADOR

Alberto Contador venceu, pela terceira vez, o Tour de France. O ciclista espanhol da Astana, o melhor da actualidade, provou ser o mais completo do pelotão que participou na nonagésima sétima edição da Grande Boucle. Sem ser tão espectacular como em anos anteriores, nas vitórias que alcançou em 2007 e 2009 - as únicas duas vezes em que esteve presente na maior competição do pelotão internacional -, o ciclista espanhol conseguiu superar Andy Schleck, numa luta intensa até ao final, para ser coroado vencedor em Paris. O trajecto de Contador foi sempre feito em crescendo: começou algo titubeante, deu mostras de não estar na plenitude das suas forças nos Alpes, aproveitou um infortúnio de Schleck para chegar à liderança nos Pirinéus e, depois disso, resistiu sempre às investidas do corredor luxemburguês da Saxo Bank. Suou, sim, mas terminou por cima. Por isso mesmo, esta foi a sua vitória mais saborosa.

O número um mundial, um jovem irreverente em busca da plena afirmação e um campeão imortalizado pelos seus feitos. Fortes, creditados, ambiciosos. Alberto Contador, Andy Schleck e Lance Armstrong preencheram, por esta ordem, o pódio da edição anterior do Tour de France. E chegaram a 2010 na linha da frente. Pelo peso de cada um deles, a discussão poderia estar centrada em Contador e Armstrong. O presente triunfante e o passado demolidor. Agora em equipas diferentes, com uma Radioshack construída em redor do norte-americano a partir da Astana - onde permaneceu El Pistolero -, sem terem de se apoiar mutuamente. Seriam rivais, opositores, gigantes na luta pela repetição de uma conquista. Andy Schleck é um jovem em ascensão, melhorando a cada ano e apoiado por uma belíssima equipa da Saxo Bank, que prometeu intrometer-se entre no duelo de titãs. E ainda com outros candidatos na sombra.

A primeira semana de prova, longe de ser uma adaptação à competição, apareceu com um trajecto perigoso, tenso e preocupante. Niguém ganharia o Tour no início, claro que não, mas poderia perder todas as possibilidades de se manter na luta. Os Alpes, ao nono dia, deixaram a vitória na nonagésima sétima edição da Grande Boucle reduzida a dois: Alberto Contador e Andy Schleck. Os dois ciclistas, os mais fortes do pelotão, aproveitaram a dureza da nona etapa, um terreno onde se sentem bem, para se destacarem de todos os rivais. Lance Armstrong já ficara de fora, destroçado e azarado como nunca, no dia anterior: duas quedas e a veterania de trinta e oito anos, sem ter consigo um colectivo tão forte como se esperaria, hipotecaram definitivamente as esperanças do norte-americano vencer o Tour de France pela oitava vez. Cadel Evans, Carlos Sastre, Andreas Klöden também vergaram perante o vigor do duo Contador-Schleck.

O DUELO

Andy Schleck explodiu, assumiu a corrida, galgou metros nos Alpes e chegou à glória. Num primeiro momento pareceu melhor do que Alberto Contador. O ciclista espanhol não esteve tão demolidor e explosivo, deu mostras de alguma quebra e, na primeira etapa realmente dura nos Alpes, claudicou perante o ataque pujante de Schleck. No entanto, Contador esteve também mais cínico e cerebral. Bem apoiado pela Astana, com grande destaque para Alexandre Vinokourov e Daniel Navarro, uma equipa sem dar mostras de fragilidade pela debandada rumo à Radioshack, El Pistolero soube disfarçar o seu momento, gerir os tempos e, a mais ou menos custo, ter o ímpeto de Andy Schleck controlado. O ciclista luxemburguês da Saxo Bank, desde a quarta etapa sem o apoio do irmão Frank, o seu braço direito, ganhou a camisola amarela na nona tirada. Na tal em que se entendeu bem com Contador. Tinha quarenta e um segundos de vantagem.

Alberto Contador cresceu. Recuperou com o tempo, restabeleceu-se, disfarçou as dificuldades e apresentou-se para a luta. Estava atrás, sim, mas nada de preocupante. Se não o conseguisse nos Pirinéus, teria no contra-relógio, a especialidade em que Andy Schleck manifesta maiores fragilidades, uma oportunidade para passar para a frente. Mas seria sempre arriscado esperar pelo penúltimo dia. E poderia ser fatal. Nos Pirinéus, depois de dias de recuperação e tranquilidade, o duo de candidatos, os mais fortes e únicos que sobreviveram à matreira primeira semana, teriam que se mostrar. Sentir as pulsações do rival, perceber o momento em que se encontravam e tentar saltar para a frente. Schleck apareceu sempre mais confiante, mais impulsivo e aguerrido. Contador, experiente e conhecendo o seu momento, jogou pela certa e, aos poucos foi-se aproximando do topo: na décima segunda etapa, ganhou dez segundos.

UM MOMENTO MARCANTE NOS PIRINÉUS

Pode-se criticar, entender que Alberto Contador não teve desportivismo e que deveria, quando a corrente da bicicleta de Andy Schleck saltou, ter esperado até que o seu rival recuperasse a condição. O corredor luxemburguês atacara, o espanhol não respondera de pronto. Num ápice, invertendo tudo, Contador passou ao ataque, levando Samuel Sánchez e Denis Menchov consigo, para roubar tempo ao então líder. Nos Pirinéus, à décima quinta etapa, o ciclista espanhol da Astana conseguiu assumir a liderança, dizimando a desvantagem de trinta e um segundos, fixando-se com oito segundos à maior sobre Andy Shcleck. O mais difícil ficou feito pelo espanhol. Agora, com Contador mais confortável, seria o luxemburguês a atacar. Tentou, fez de tudo, escalou até ao Col do Tourmalet, imprimiu um ritmo vigoroso. Alberto Contador sempre respondeu bem. No contra-relógio, onde evoluiu imenso, também procurou ser feliz.

Alberto Contador cortou a meta, o contra-relógio ficara para trás, a camisola amarela não lhe iria fugir mas continuou a pedalar. Deu tudo, forçou, pedalou para se manter na liderança. Andy Schleck começara bem, ameaçando-o, reduzindo a desvantagem. Contador tremeu mas, à medida que os cinquenta e dois quilómetros foram passando, alargou a vantagem e, mesmo tendo realizado um tempo modesto, confirmou o triunfo. Terminou o Tour de France 2010 com trinta e nove segundos de vantagem sobre Andy Schleck. O mesmo tempo, por curiosidade e ironia, que ganhara na décima quinta etapa, depois da avaria sofrida pelo luxemburguês. O último lugar do pódio final - até ao contra-relógio do penúltimo dia ocupado por Samuel Sánchez, ciclista espanhol da Euskautel-Euskadi -, ficou na posse de Denis Menchov, da Rabobank, que assim repetiu a posição de 2008, passando uma borracha sobre
a má prestação da edição anterior.

LANCE ARMSTRONG E RADIOSHACK: O ADEUS E A DESILUSÃO

Sete vitórias consecutivas no Tour de France são uma marca bem difícil de bater. Lance Armstrong conseguiu-o, entre 1999 e 2005, com grande classe. Apesar de já não ter nada mais a provar, também pelo mérito dos seus triunfos, decidiu regressar no ano passado. Foi colega de Alberto Contador, o agora número um mundial, posição que Lance ocupou durante épocas a fio, na Astana e conseguiu um belíssimo terceiro lugar. Voltou de novo em 2010, com uma equipa recém-criada e recheada de ciclistas de qualidade, todos eles provenientes da equipa cazaque, declaradamente para tentar a sua oitava vitória na Grande Boucle. Falhou. Demasiado cedo, ainda na primeira semana, deixou de estar na luta pelo triunfo final. Porque já não conta com a mesma disponibilidade, naturalmente, mas também porque encontrou obstáculos contra os quais pouco podia fazer: um furo no pavé e duas quedas duras nos Alpes. Foi infeliz.

Sem possibilidades de lutar pela vitória, com o objectivo arruinado e a treze minutos da liderança, o que poderia fazer Lance Armstrong? Apenas desfrutar da corrida, manter-se fiel aos seus princípios e chegar a Paris. Causou estranheza ver o heptavencedor do Tour cortar a meta atrasado, escondido, sorridente e nada preocupado com o atraso cada vez maior para a camisola amarela. Levi Leipheimer, então na sexta posição, passou a ser o líder da Radioshack. Mas é diferente. Com o falhanço de Armstrong, com ambições destroçadas pelos novos heróis do pelotão mundial, também a estratégia da equipa Radioshack fracassou. Lance ainda tentou, já na terceira semana, uma vitória em etapa, uma espécie de consolação, mas foi incapaz para se superiorizar ao sprint final, forte e triunfante, de Pierrick Fédrigo. Em Paris, onde esteve pela nona vez, terminou na vigésima terceira posição. A quase quarenta minutos de Contador.

A Radioshack chegou ao Tour de France 2010 em força. Recém-criada, com Johan Bruyneel na chefia, Lance Armstrong no papel de estrela e, para o que desse e viesse, Levi Leipheimer e Andreas Klöden. A verdade, contudo, é que a equipa norte-americana foi uma verdadeira desilusão. Mesmo assim, venceu colectivamente e obteve uma vitória em etapa. Na chegada a Gap, na décima tirada, Sérgio Paulinho, ciclista português, conseguiu superar-se a Vasil Kiryienka (Caisse d'Epargne) e, ainda que por centímetros, venceu. Por mais paradoxal que pareça, a maior façanha da Radioshack, já com todos os seus possíveis candidatos a uma boa classificação afastados dos primeiros postos, foi alcançada por um trabalhador, um operário, alguém que se acostumou a viver na sombra e a trabalhar para os seus líderes. Na geral, com o último falhanço de Leipheimer nos Pirinéus, a Radioshack ficou-se por um décimo lugar, alcançado por Chris Horner...

2 comentários:

Tiago Nogueira disse...

Parabéns Maicon! http://footinmyheart.blogspot.com/

um abraço

JornalSóDesporto disse...

Artigo Excelente.